A Proposta do OE consagra um conjunto de alterações cirúrgicas ao Código do IRC que visam, acima de tudo, uma aproximação do conceito interno de “estabelecimento estável” ao que tem vindo a ser adotado ao nível da OCDE. São alterações que, por um lado, implicam a ampliação das competências tributárias de Portugal (relativamente a atividades conexas com o território português), mas que visam também o combate à erosão da base tributária em linha com as recomendações da OCDE – Ação 7 do relatório BEPS (Base Erosion and Profit Shifting), embora muitas apresentem problemas de conformidade com os Tratados Internacionais celebrados por Portugal.
A par das alterações inseridas diretamente no Código do IRC, destacamos as propostas que incidem sobre incentivos fiscais (como o SIFIDE, o RFAI e CFEI) e a autorização legislativa para a criação do Programa de Valorização do Interior, que abordamos especificamente na secção dos Benefícios Fiscais
Conceito de estabelecimento estável – novas realidades abrangidas
A Proposta do OE prevê o alargamento do conceito de estabelecimento estável, com o intuito de sujeitar a tributação em Portugal de atividades até hoje não previstas ou mesmo expressamente excluídas deste conceito.
A Proposta do OE promove uma verdadeira alteração de paradigma no conceito de estabelecimento estável, que passará a abranger rendimentos derivados:
Esta é uma iniciativa em sentido divergente da OCDE, aproximando o sistema fiscal português da Convenção Modelo das Nações Unidas e que poderá não ser compatível com uma parte significativa dos Acordos para Evitar a Dupla Tributação celebrados por Portugal.
Conceito de estabelecimento estável – previsão de requisito temporal
Prevê-se igualmente que passem a coexistir critérios distintos, no que respeita ao requisito temporal das atividades exercidas em Portugal, para cada tipo de estabelecimento estável. Assim, mantém-se o período de 6 meses de atividade para estaleiros de construção, reduzindo-se este período para 90 dias no caso de uma “instalação, plataforma ou navio para exploração de recursos naturais”.
Conceito de estabelecimento estável – Agência
O conceito atual de estabelecimento estável abrange as atividades desenvolvidas por um agente, desde que este não seja jurídica e economicamente independente. Para que exista um estabelecimento estável, o agente tem de atuar em território português, por conta de uma entidade não residente, dispondo (e exercendo habitualmente) de poderes de intermediação e de conclusão de contratos que vinculem essa empresa.
A Proposta do OE pretende materializar o princípio da substância sobre a forma, numa evolução do conceito de “agente” em linha com as recomendações da OCDE. Nesse sentido, prevê-se que o conceito de agente passe a incluir também uma pessoa que apenas exerça habitualmente um papel determinante para a celebração de contratos, de forma rotineira e sem alterações substanciais.
A Proposta do OE prevê ainda uma densificação do tipo de contratos que poderão implicar a existência de um estabelecimento estável, nomeadamente contratos que visem (i) a transmissão da propriedade ou concessão do direito de uso de bens pertencentes à (ou legitimamente detidos pela) entidade não residente ou (ii) a prestação de serviços por essa entidade.
Uma vez mais, importa notar que esta alteração poderá não ser compatível com uma parte significativa dos Acordos para evitar a Dupla Tributação celebrados por Portugal.
Estabelecimento estável – Atividades de carácter preparatório ou auxiliar
Na sua redação atual, o Código do IRC exclui expressamente do conceito de estabelecimento estável as atividades de caráter preparatório ou auxiliar, como seja a detenção de instalações utilizadas unicamente para armazenar, expor ou entregar mercadorias pertencentes à entidade não residente.
Com o alargamento do conceito de estabelecimento estável às atividades de venda de bens e mercadorias, a Proposta do OE reduz as atividades de natureza preparatória à armazenagem e exposição – excluindo as instalações para entrega de bens.