O recente crescimento do setor espacial em África decorre não apenas dos desenvolvimentos comerciais, científicos e tecnológicos recentes, mas também do número de estratégias, programas e agências espaciais criados e em desenvolvimento. Com efeito, as estratégias e programas enquadram os objetivos e o investimento dos Estados no setor – criando confiança e transparência para o setor privado –, enquanto as agências espaciais desempenham um papel central no apoio e identificação de oportunidades para as empresas.

Neste contexto, em janeiro de 2023, a Comissão da União Africana e o governo egípcio inauguraram formalmente a Agência Espacial Africana, sediada no Egito. À luz dos objetivos delineados na Agenda 2063 da União Africana, bem como da Política Espacial Africana e da Estratégia Espacial Africana, a Agência, que foi constituída como um órgão da União Africana, conduzirá a governação, promoção e coordenação eficaz das atividades espaciais no continente, implementando a Política Espacial e a Estratégia Espacial africanas.

Entre outras incumbências, a Agência deve reforçar as missões espaciais no continente com vista a garantir um ótimo acesso aos dados, informações, serviços e produtos obtidos do espaço, bem como desenvolver uma indústria e serviços espaciais sustentáveis, fortes e locais que respondam às necessidades do continente africano. Cabe ainda à Agência Espacial Africana apoiar os Estados-membros e as comunidades económicas regionais (CER) na elaboração dos respetivos programas espaciais e na edificação das suas infraestruturas espaciais. De acordo com os seus Estatutos, a Agência deve ainda coordenar, a nível continental, um quadro regulador para as atividades espaciais em África.

De forma paralela, recorde-se que a Estratégia para a Ciência, Tecnologia e Inovação para África 2024 (a qual visa transformar África numa sociedade baseada no conhecimento e na inovação) refere expressamente o papel do Espaço no desenvolvimento socioeconómico do continente. De igual modo, a Estratégia de Transformação Digital para África (2020-2030) visa priorizar e acelerar a transformação digital no continente, criando um mercado único digital até 2030 – sendo que, também aqui, as tecnologias espaciais podem desempenhar um papel relevante.

Outras iniciativas, como a EIS-Africa, o Africa GeoPortal, o Digital Earth Africa e a  Africa Knowledge Platform, bem como a K4P Alliances, demonstram também o papel central das tecnologias e informação espaciais nos ecossistemas digitais, incluindo designadamente nos processos de apoio à tomada de decisão.

Adicionalmente, vários países africanos têm vindo a desenvolver programas e quadros legais para o setor do Espaço, bem como a constituir agências espaciais.

Por um lado, note-se que, em 2022, as nações africanas alocaram um total de 534,9 milhões USD ao desenvolvimento e gestão dos seus programas espaciais, o que representa um aumento de 2,24% em relação aos 523,2 milhões USD investidos em 2021.

Por outro lado, e pese embora só alguns países tenham aprovado leis para regular as atividades espaciais  (é o que sucede, por exemplo, com a África do Sul e a Nigéria), um número crescente de países está a constituir agências espaciais: dados de julho de 2022 indicam que cerca de 21 países africanos já tinham então desenvolvido e implementado as suas agências espaciais.

Outras iniciativas recentes têm também sido adotadas por países africanos.

É o caso, por exemplo, de Cabo Verde, que, tendo já anunciado a sua estratégia espacial nacional (a qual foi discutida publicamente em 2021), concluiu, em 2023, uma parceria com o Luxemburgo no domínio da defesa, para utilização de imagens de satélite para vigilância e patrulhamento das águas territoriais do arquipélago. Já anteriormente Cabo Verde havia concluído outras parcerias relevantes, como é o caso da participação, através do Instituto do Mar, no AIR Centre (Centro Internacional de Investigação do Atlântico), iniciativa intergovernamental focada no espaço, clima, energia, oceanos e dados.

É o caso também de Angola, que, no contexto da sua estratégia nacional espacial, coordenada pelo Gabinete de Gestão do Programa Espacial Nacional, inaugurou o seu Centro de Controlo e Missão de Satélites em janeiro de 2023. É, ainda, o caso de Moçambique, que, no âmbito do evento Europe-Africa Space Earth Observation High-Level Forum, anunciou a adoção de ações com impacto no Espaço, incluindo o objetivo de criar uma agência espacial no país.

Os países africanos estão também a posicionar-se internacionalmente neste setor. Por exemplo, o projeto “Space Law for New Space Actors” da UNOOSA (iniciativa que visa a promoção de missões de consultoria técnica e de acompanhamento de atores espaciais emergentes, para facilitar o desenvolvimento das suas capacidades no domínio da legislação, regulação e política espacial) tem tido o envolvimento recente de países como o Quénia (no qual haverá uma missão de aconselhamento técnico em 2023) e Angola.

Por outro lado, países como a Nigéria e o Ruanda assinaram os Acordos Artemis em 2022, apontando para o papel preponderante que as iniciativas internacionais começam a ter para os Estados africanos.

Destacam-se, ainda, outras iniciativas de cooperação bilaterais, como seja a assinatura, em janeiro de 2023, de um memorando de entendimento/acordo espacial entre a Argélia e a Itália, a renovação da parceria de exploração lunar entre a África do Sul e os Estados Unidos da América, a celebração de um acordo estratégico entre o Egito e a Índia, expandindo a cooperação já existente entre os dois países em matéria de Espaço, e o fortalecimento da cooperação estratégica entre Moçambique e a Venezuela em matéria espacial.

O desenvolvimento de políticas, estratégias e programas espaciais, a constituição de agências espaciais, a criação de leis reguladoras das atividades espaciais e a celebração de parcerias têm um papel central na promoção das atividades espaciais e no aproveitamento das oportunidades do setor, garantindo a autonomia de África em matéria espacial. Para o efeito, é essencial garantir que o quadro político e jurídico criado fomenta a inovação e o empreendedorismo, atrai o investimento e empresas estrangeiras e toma em conta os recentes desafios da segurança e cibersegurança, da sustentabilidade e da digitalização. A este respeito, as políticas, leis e abordagens digitais são também um instrumento central para o desenvolvimento do setor espacial, permitindo aproveitar tecnologias como a inteligência artificial, a DLT/blockchain, a Internet das Coisas ou o Big Data para melhoria dos processos e da tomada de decisão. Da mesma forma, os produtos e serviços espaciais desempenham um papel indispensável, como se viu, na transição digital de todos os setores da economia.

O setor privado deve, também, aproveitar os avanços do continente e dos países africanos para expansão das suas atividades e ofertas comerciais, bem como de parcerias e projetos conjuntos: a procura crescente de produtos e serviços espaciais, os incentivos e apoio às atividades espaciais, o desenvolvimento de atividades espaciais upstream, e o investimento na digitalização, criam oportunidades únicas para as empresas, que devem por isso posicionar-se de forma a tirarem o máximo partido deste setor em crescimento.