A denominada semana de quatro dias é uma forma inovadora de organização do trabalho que consiste na redução do período normal de trabalho semanal, sem perda de retribuição.
O modelo surgiu – de modo relativamente organizado – na Nova Zelândia em 2019, encontrando-se, hoje, em experimentação em diferentes geografias, nomeadamente em países como Espanha, Austrália, Islândia ou Japão.
A semana de quatro dias assume contornos aliciantes para ambas as partes da relação laboral, sobretudo porquanto anuncia vantagens ou benefícios para trabalhadores e empregadores:
i) Promete aos trabalhadores mais tempo livre, com correspondentes impactos positivos a nível da saúde, bem-estar e gestão da vida e economia doméstica; e
ii) Assevera aos empregadores a manutenção da produtividade e competitividade, com um ganho de cotação pública (ao promover metas de ESG como a inovação, a igualdade de género e a eficiência climática).
Contudo, a semana dos quatro dias não é isenta de desafios, pressupondo pontos de equilíbrio de difícil execução ou concretização. Com efeito, ainda poucas (e tendencialmente mais inovadoras) empresas estão predispostas a adotar uma transição a este nível, pelo que a amostragem não permite, ainda, retirar conclusões seguras e replicáveis, sendo certo que a medida é de muito difícil implementação em certas áreas de atividade, nomeadamente nas indústrias, nas quais outros modelos gestionários têm vindo a consolidar-se no tecido empresarial.
De um ponto de vista jurídico, a semana dos quatro dias é objetivamente inovadora, já que as figuras de flexibilidade laboral atualmente contempladas no Código de Trabalho (desde logo o horário concentrado e o trabalho a tempo parcial) não permitem a redução do horário com a manutenção do nível salarial.
Mas será possível adotar este modelo em Portugal?
Através da Portaria n.º 301/2022, de 20 de dezembro, foi lançado um projeto piloto para averiguar a viabilidade da semana de quatro dias em Portugal. Ainda que sem apoio financeiro do Estado português, o piloto, implementado ao longo de 2023, contou com apoio técnico do IEFP, I.P., e consultoria da plataforma 4 Day Week Global.
O projeto piloto reuniu a participação (voluntária) de cerca de quarenta empresas, abrangendo mais de mil trabalhadores, num período de seis meses, com uma redução do período normal de trabalho semanal para 36 horas (de forma reversível). Os resultados, publicados em junho de 2024, foram reveladores.
Do lado das empresas, verificou-se a redução dos níveis de absentismo (em cerca de 45%), o aumento da capacidade de recrutamento e da retenção de trabalhadores (em cerca de 30%), bem como melhorias operacionais generalizadas (i. e. melhor funcionamento das equipas, melhoria dos processos, maior eficiência no uso da tecnologia, etc.), sem baixas de produtividade relevantes.
Já do lado dos trabalhadores, aumentaram os níveis de saúde física e mental, registando-se uma redução substancial no número de trabalhadores com dificuldades em conciliar o trabalho com a vida família ou o trabalho com a vida pessoal (respetivamente, de 46% e 50% para 17% e 16%)
Em termos gerais, o acréscimo de “tempo livre” foi bem recebido pelos trabalhadores. No entanto, essa valorização foi mais acentuada em segmentos específicos da comunidade laboral, nomeadamente: mulheres (vs homens); trabalhadores com filhos (vs trabalhadores sem filhos); e trabalhadores com salários mais baixos (vs trabalhadores com salários mais elevados).
Ainda que exista uma natural resistência à mudança organizacional por parte das empresas, o projeto piloto parece ter demonstrado, senão a viabilidade, a potencialidade da semana de quatro dias em Portugal; aliás, a maioria das empresas participantes, não obstante os desafios, abandonaram as quarenta horas.
Assim, mais do que uma imposição ou mudança abrupta, naturalmente disruptiva e eventualmente contraproducente, as empresas podem encontrar inspiração nos exemplos experimentados no projeto piloto, ponderando medidas graduais de transição, ajustadas à realidade do seu negócio e em espírito de diálogo com os seus trabalhadores e respetivos representantes.
Em conclusão, embora não possa ser encarada como uma solução universal e padronizada, a semana de quatro dias é uma oportunidade real e inovadora para repensar a organização do trabalho em Portugal. De facto, à medida que mais empresas - nacionais e multinacionais - adotarem este modelo, as entidades que, reunindo condições para o fazer, optarem por não acompanhar esta tendência poderão tornar-se menos atrativas para os seus recursos humanos (ao nível quer da retenção, quer da atração de talento), colocando-se em desvantagem num mercado laboral cada vez mais exigente e competitivo.