Nos últimos anos, temos vindo a assistir a uma profunda transformação do mercado de trabalho, resultado de uma confluência de fatores, de entre os quais podemos destacar, entre outros, os avanços tecnológicos, a emergência do capital humano como elemento fulcral na gestão de pessoas, as alterações demográficas, e o impacto da pandemia da covid-19 como catalisador de diferentes modalidades de trabalho remoto.

As transformações impulsionaram também formas de trabalho que desafiam os tradicionais conceitos laborais de trabalhador, empregador, e, naturalmente, da própria relação de trabalho.  

Foi neste contexto de ajustamento e reformulação de alguns dos paradigmas clássicos da relação laboral que começaram a emergir modelos de relações contratuais atípicos, em que determinadas entidades assumem formalmente o papel de empregador em relações laborais cuja materialidade tradicional pertence a outras entidades.

Estes modelos têm tido particular adesão entre empresas multinacionais que estão interessadas em expandir a sua força de trabalho para novos países onde não possuem estrutura jurídica, ou em contratar talentos sediados em jurisdições onde não operam.

Este modelo funciona por meio da contratação de trabalhadores em determinado país através de uma entidade intermediária – o Employers of Record (“EoR”) – que, por sua vez, cede esses trabalhadores à empresa beneficiária do trabalho. Essa empresa beneficiária, a maior parte das vezes sem estrutura jurídica no país do exercício da atividade, exerce o poder de direção sobre os trabalhadores. No fundo, os EoR atuam como empregadores formais dos trabalhadores, cuja atividade beneficia, de forma temporária ou permanente, uma terceira entidade.

Cabe ao EoR gerir toda a parte administrativa da relação laboral no país onde o trabalho é realizado: a celebração dos contratos de trabalho, o processamento salarial, o pagamento de impostos e de contribuições para segurança social, a contratação dos seguros necessários, bem como o cumprimento de todas as demais normas e requisitos aplicáveis à relação laboral.

A contratação de trabalhadores por via dos EoR, além de reduzir o risco de incumprimento das legislações locais por parte das empresas beneficiárias do trabalho, também funciona como uma terceirização de funções administrativas, deixando às empresas beneficiárias mais espaço para se focarem na estratégia do negócio.

Os EoR funcionam, para aquelas empresas beneficiárias, como um parceiro estratégico, permitindo-lhes entrar em novos mercados de forma mais eficiente e ágil.

Contudo, o modelo de EoR ainda está em desenvolvimento e carece de regulamentação em Portugal, o que levanta diversos desafios jurídicos quanto ao seu atual enquadramento legal e quanto às obrigações impostas às partes. Em concreto, entre outras, o alcance e efetividade da proteção dos interesses empresariais – cláusulas de confidencialidade, titularidade da propriedade intelectual, lealdade, não concorrência pós-contratual. As questões também se colocam, naturalmente, em relação aos efeitos da cessação unilateral que seja promovida por qualquer uma das entidades e respetivo enquadramento no quadro legal. 

Certo é que este novo panorama veio para ficar no futuro das relações laborais. Por esse motivo, é evidente a necessidade de atualizar a legislação laboral portuguesa, ainda baseada num modelo tradicional de relação laboral, sendo essencial que ela acompanhe e regule estas mudanças dinâmicas.

O desafio reside em equilibrar direitos e segurança no trabalho sem comprometer a inovação ou restringir a flexibilidade já alcançada. As novas regras devem ter em consideração os benefícios da transformação digital com os riscos da precarização, garantindo que a modernização do mercado de trabalho traz benefícios efetivos para trabalhadores e empregadores e que as normas laborais não funcionam como obstáculos assentes em premissas conceptuais datadas.

O futuro do trabalho está em constante evolução. Compreender essas transformações é fundamental para criar um ambiente laboral sustentável e adaptado às novas realidades.