Excluindo os novos incentivos fiscais, a Proposta do OE prevê um conjunto reduzido de alterações ao Código do IRC, destacando-se como positiva a simplificação do regime de dedução de prejuízos fiscais e o há muito esperado alargamento do princípio da solidariedade entre exercícios, com a eliminação dos limites temporais de reporte atualmente existentes.

Em contraponto, pela negativa, prevê-se a redução, para 65%, do montante de prejuízos fiscais que podem ser deduzidos ao lucro tributável de cada exercício, o que constitui uma nefasta originalidade do sistema fiscal português, que vem sendo agravada ao longo dos anos, em prejuízo do princípio da solidariedade entre os exercícios.

Acresce que o regime de dedução e reporte de prejuízos fiscais sofreu já vastas modificações ao longo da última década e, consequentemente, dispõe de normas aplicáveis de forma muito distinta em função do ano dos prejuízos apurados, o que o torna complexo e originador de situações de injustiça fiscal.

Adicionalmente, salientamos a proposta de aumento do montante da matéria coletável ao qual é aplicável a taxa de IRC reduzida de 17%.

Por fim, propõem-se alterações ao nível da redução das taxas de tributação autónoma das viaturas ligeiras de passageiros híbridas plug-in e de viaturas ligeiras de passageiros movidas a gás natural veicular.

 

Prejuízos Fiscais

A Proposta do OE contempla um conjunto de alterações relevantes no âmbito do regime de dedução dos prejuízos fiscais.

Prevê-se, assim, a eliminação do período de reporte de prejuízos fiscais, passando os mesmos a poder ser deduzidos aos lucros tributáveis dos sujeitos passivos sem qualquer limite temporal. Note-se que, atualmente, os prejuízos fiscais apenas podem ser deduzidos aos lucros tributáveis de cinco ou doze períodos de tributação posteriores, dependendo das características da empresa.

Por outro lado, a Proposta do OE prevê a redução da atual percentagem de dedução dos prejuízos fiscais em cada período de tributação, passando de 70% para 65% do respetivo lucro tributável.

Caso venham a ser aprovadas, as propostas de alteração mencionadas serão aplicáveis à dedução aos lucros tributáveis dos períodos de tributação que se iniciem em, ou após, 1 de janeiro de 2023, bem como aos prejuízos fiscais apurados em períodos de tributação anteriores a 1 de janeiro de 2023, cujo período de dedução ainda se encontre em curso na data da entrada em vigor da presente lei.

A Proposta do OE prevê, também, a introdução de uma relevante medida em caso de alteração de mais de 50% do capital social ou dos direitos de voto. Com efeito, atualmente, os prejuízos fiscais deixam de poder ser deduzidos aos lucros tributáveis dos sujeitos passivos caso ocorra uma alteração de mais de 50% do capital social ou dos direitos de voto, exceto se determinadas condições estiverem cumpridas (v.g., passagem de titularidade direta para indireta, alterações decorrentes de operação efetuadas ao abrigo do regime especial de neutralidade fiscal, entre outras). Nos restantes casos, é necessário solicitar ao ministro das finanças uma autorização para manutenção do direito de reporte dos prejuízos fiscais, o que apenas é aceite em caso de reconhecido interesse económico.

A Proposta do OE, não obstante manter a limitação em caso de alteração de mais de 50% do capital social ou dos direitos de voto, propõe que a mesma não se aplique quando se conclua que a operação não teve como principal objetivo ou como um dos principais objetivos a evasão fiscal, o que pode considerar-se verificado, nomeadamente, nos casos em que a operação tenha sido realizada por razões económicas válidas.

Salientamos, por isso, como positiva a presente proposta de alteração, que visa eliminar um regime formal e cujo processo de decisão se revela demasiado moroso (por norma, o prazo de decisão destes requerimentos ascende a vários anos), passando a colocar-se o ónus no sujeito passivo, que deverá ser capaz de demonstrar as razões económicas válidas subjacentes à alteração de mais de 50% do capital social ou dos direitos de voto, por forma a poder manter automaticamente o direito à dedução dos prejuízos fiscais.

A Proposta do OE introduz ainda outras alterações ao Código do IRC, tendo em vista alinhar o regime de dedução de prejuízos fiscais com as demais normas do Código, entre as quais destacamos as seguintes:

a)     No âmbito do regime especial de tributação de grupos de sociedades, nos casos em que passe a existir uma nova sociedade dominante ou nos casos em que uma sociedade dominante de um grupo de sociedades adquire o domínio de uma sociedade dominante de um outro grupo de sociedades e existam prejuízos fiscais reportáveis, a manutenção do direito à dedução dos mesmos passa igualmente a ser automática, deixando de ser necessária a apresentação de um pedido de autorização. Passa, no entanto, a prever-se também uma norma específica antiabuso, ao abrigo da qual o direito de manutenção dos prejuízos não é aplicável quando se conclua que a operação teve como principal objetivo ou como um dos principais objetivos a evasão fiscal, o que pode considerar-se verificado, nomeadamente, nos casos em que a operação não tenha sido realizada por razões económicas válidas;

b)     No âmbito do regime especial de neutralidade fiscal, clarifica-se que a dedução de prejuízos fiscais deve ser efetuada de acordo com as novas normas de dedução.

 

Gastos de financiamento líquidos

Relativamente aos gastos de financiamento líquidos, a Proposta do OE prevê que, em caso de alteração de mais de 50% da titularidade do capital social ou dos direitos de voto, o direito de reporte dos gastos de financiamento líquidos em excesso e o direito de reporte das “folgas” disponíveis podem ser mantidos quando se conclua que a operação não teve como principal objetivo ou como um dos principais objetivos a evasão fiscal, o que pode considerar-se verificado, nomeadamente, nos casos em que a operação tenha sido realizada por razões económicas válidas.

 

Taxa de IRC

Propõe-se que a taxa de IRC reduzida de 17% passe a aplicar-se aos primeiros € 50.000 de matéria coletável, ao invés dos atuais € 25.000.

Esta taxa continua a aplicar-se aos sujeitos passivos que exerçam, diretamente e a título principal, uma atividade económica de natureza agrícola, comercial ou industrial, que sejam qualificados como PME, passando a Proposta a prever igualmente a sua aplicação aos sujeitos passivos que sejam qualificados como empresa de pequena-média capitalização (Small Mid Cap).

 

Tributações autónomas

A Proposta do OE prevê a diminuição da tributação autónoma de viaturas ligeiras de passageiros híbridas plug-in e de viaturas ligeiras de passageiros movidas a gás natural veicular (GNV), passando as respetivas taxas a ascender a 2,5% (atualmente 5% para as viaturas híbridas plug-in e 7,5% para as viaturas movidas a GNV); 7,5% (atualmente 10% para as viaturas híbridas plug-in e 15% para as viaturas movidas a GNV) e 15% (atualmente 17,5% para as viaturas híbridas plug-in e 27,5% para as viaturas movidas a GNV) em função do valor de aquisição do veículo em causa.

A Proposta prevê ainda que passem a ser tributados autonomamente, à taxa de 10%, os veículos movidos exclusivamente a energia elétrica com um valor de aquisição igual ou superior a € 62.500.